Iceberg à frente!

Iceberg à frente!

O que vimos, e ainda vemos, acontecer na cadeia de semicondutores com um desabastecimento sem precedentes, parece que se repetirá agora com borracha.

Pode ser este o principal motivo da recente onda de aumentos anunciados pelos principais fabricantes mundiais de pneus e algumas montadoras já estariam monitorando de perto a questão.

Mas os danos não se limitam à indústria de pneumáticos, mas afeta também a produção, e disponibilidade, de tapetes, tubos e materiais isolantes, entre outros. Como fatores chave para este novo pesadelo logístico, a agência americana Bloomberg cita um crescimento repentino de demanda, aumento dos níveis de uso de borracha na China e uma praga que afetou as plantações de seringueiras no Sudeste Asiático, maior polo mundial de produção e exportação de borracha natural,  fabricada a partir do látex extraído desta árvore.

Em 2020, enquanto os Estados Unidos, quarto maior usuário de borracha natural, utilizou cerca de 0.85 milhões toneladas, a China, o primeiro do ranking, usou nada menos que 5.44 milhões de toneladas no mesmo período. Para deixar ainda mais claro a discrepância dos números, Índia e União Europeia (incluindo o Reino Unido), segundo e terceiro colocados, consumiram 1.04 e 0.99 milhões de toneladas respectivamente.

Seria um novo golpe à indústria automotiva mundial, potencialmente mais severo que a crise causada pela falta de chips e semicondutores, porque além da indústria de produção de borracha natural ser composta basicamente de pequenos produtores que não conseguem responder à variações elevadas de demanda de forma rápida, uma seringueira leva em torno de sete anos para estar madura e apta para o ciclo de extração do látex.

Por tudo isso, alguns analistas apontam o alto risco de termos uma crise de abastecimento que se estenda por vários anos, criando uma margem de aumento nos próximos cinco anos de 150% no quilo da borracha natural.

Vale lembrar que, de acordo com a consultoria AlixPartners, a crise de semicondutores, agravada pela redução nos volumes de produção por conta da COVID-19,  pode causar a perda de 61 bilhões de dólares só em 2021.

E não para por aí: de acordo com informações do Trafigura Group, pode haver um déficit de cobre estimado em 10 milhões de toneladas até 2030 caso nenhuma nova mina seja construída.

Sinceramente, é muito difícil entender o que está acontecendo no mundo desde o início da crise sanitária que vem nos afetando de várias maneiras. Mas é fato que a filosofia do just-in-time, há décadas o preceito sagrado da indústria automotiva para o controle de custos a partir de estoques enxutos, está causando impactos e prejuízos muito acima dos ganhos gerados ao deixar toda uma indústria vulnerável durante períodos de alta volatilidade na cadeia de suprimentos.

Assim como já se tem como certo um “novo normal” pós-pandemia, se faz necessária uma revisão profunda nos métodos e modelos empregados em diversos setores industriais e produtivos. Temos pouco tempo para virarmos à estibordo com toda a potência para evitarmos esse enorme iceberg!

Carlos Barcha é especialista em pneus com 20 anos de experiência no setor automotivo, fundador e CEO da The Consulting Business Solutions. As opiniões e informações aqui expressas são pessoais e não refletem necessariamente o posicionamento destas empresas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *