Falta de insumos: a crise de oferta da década
Por Marcos Gonzalez, diretor responsável pelo segmento automotivo da Becomex
Se o ano passado foi marcado pela interrupção de diversas montadoras e sistemistas em função do perigo de contágio com o vírus Covid-19, neste ano as paradas de fábricas se dão pela falta de insumos como semicondutores e pneus. Os dois problemas, naturalmente, são correlatos sendo o segundo consequência do primeiro.
Estudo atualizados do Boston Consulting Group (BCG), divulgados nesta semana pela Anfavea, dão conta que, no mundo, de 10 a 12 milhões de veículos deixarão de ser produzidos por falta de componentes, em especial, os chips. Claro que no Brasil não será diferente e a própria Anfavea estima que esse déficit chegará a mais de 120 mil unidades.
Os estoques das montadoras brasileiras seguem baixos nos últimos seis meses. Dão conta, no máximo, para 16 dias de consumo. Em contrapartida, os pátios estão abarrotados de veículos incompletos. Isso significa que quem compra um carro zero km hoje tem 90% de chance de só recebê-lo em janeiro ou fevereiro do ano que vem.
Mesmo com uma ligeira melhora de 6,5% nas vendas na comparação com outubro, os resultados ficaram muito aquém para um mês historicamente aquecido. Os 173 mil autoveículos licenciados representaram recuo de 23,1% sobre o mesmo mês de 2020, no pior novembro em 16 anos, segundo as estatísticas apresentadas pela Anfavea.
Em novembro foram produzidas 206 mil unidades, 15,1% a mais que em outubro, porém 13,5% a menos que em novembro de 2020, configurando o pior resultado para o mês desde a crise (de demanda) de 2015.
Sem conseguir dar conta da demanda do mercado interno, as exportações acabam sendo prejudicadas. As 28 mil unidades exportadas no mês passado representam volume 6% inferior a outubro e uma queda enorme de 36,3% comparado com novembro do ano passado, quando o Brasil exportou 44 mil veículos.
Portanto, este ano, que se esperava uma recuperação para o setor automotivo, foi severamente afetado pelas sequelas econômicas da pandemia. As exportações de automóveis, que poderiam gerar ganhos financeiros para a toda cadeia automotiva, em função da desvalorização cambial, de mais de 600 mil unidades em 2018, possivelmente não vão chegar a 360 mil veículos neste ano.
Alguma normalidade logística e de abastecimento é esperada apenas para o segundo semestre do próximo ano. Até lá montadoras, sistemistas e fabricantes de autopeças seguem em esforço conjunto para contornar os problemas e equilibrar interesses diante da forte pressão sobre todos os custos, e que podem ser amenizados com estratégias tributárias colaborativas. Mas o lado positivo é todos os sinais apontam que a demanda seguirá aquecida. A crise, por ora, embora dispendiosa e longa, é de oferta.