Vale a pena usar pneus run flat no Brasil?
54PSI convida José Carlos Quadrelli para responder. José Carlos Quadrelli: Depende. Antes de responder precisamos entender o que são e como funcionam esses pneus. Os pneus run flat (pneus que “rodam furados” numa tradução livre do inglês) foram desenvolvidos há mais de quarenta anos para resolver vários percalços que acometem o motorista que acaba de […]
por Mateus Taday em 29/04/2025 - Atualizado em 01/05/2025
54PSI convida José Carlos Quadrelli para responder.
José Carlos Quadrelli: Depende. Antes de responder precisamos entender o que são e como funcionam esses pneus.
Os pneus run flat (pneus que “rodam furados” numa tradução livre do inglês) foram desenvolvidos há mais de quarenta anos para resolver vários percalços que acometem o motorista que acaba de ter um pneu furado*, ou seja:
- possível perda de controle do veículo dependendo do tipo e extensão do furo ou rasgo;
- atraso em chegar ao destino;
- possibilidade de ter de esvaziar o porta-malas para retirar o pneu estepe;
- necessidade de manusear o pneu furado e o pneu estepe, um serviço sujo e que necessita de força e cuidado;
- possibilidade de ter de parar em lugar perigoso para fazer a troca;
- necessidade de buscar auxílio caso não se consiga fazer a troca sozinho, nem sempre disponível.
Com o pneu run flat é possível rodar com o pneu sem ar por até 80 km a uma velocidade máxima de 80 km/h. Isso graças à sua construção que possui paredes laterais mais espessas que suportam o peso do veículo mesmo com o pneu desinflado, além de talões reforçados para manter o pneu preso à roda e compostos de borracha mais resistentes ao calor na banda de rodagem.
Pelo acima exposto, fica claro que estes pneus são mais robustos que pneus normais e a suspensão do veículo que utiliza os mesmos deve ser ajustada para compensar sua maior dureza. Por esse motivo os pneus run flat costumavam ser equipados apenas como equipamento original de fábrica e não eram recomendados para serem montados em veículos que vinham de fábrica com pneus normais. Também por isso não se recomenda substituir os pneus run flat originais por pneus normais já que na busca por um rodar mais macio acaba-se comprometendo a dirigibilidade e a segurança do veículo em alta velocidade.
Esta situação só começou a ser resolvida com a introdução da terceira geração de pneus run flat começando pela Bridgestone, em 2014, com seus pneus DriveGuard, que possuem laterais mais macias e que permitem sua montagem como pneus de reposição e não mais apenas como equipamento original. Isso só se tornou possível pelo fato de todos os automóveis vendidos nos EUA a partir de 1º de setembro de 2007 serem obrigados por lei a montar sistemas TPMS – sistema de monitoramento de pressão dos pneus na sigla em inglês -, sem o que não é possível se usar os pneus run flat já que o motorista não irá perceber que houve perda de pressão de inflação num pneu desse tipo.
No Brasil os pneus run flat são encontrados principalmente em alguns carros importados de marcas de luxo, mas até já apareceram em veículos de categorias inferiores, como os últimos EcoSports da Ford, por exemplo (aqueles sem estepe montado na porta traseira). A utilização em larga escala só não ocorreu ainda devido ao seu preço mais alto, pela baixa disponibilidade de reposição e pelo fato de os equipamentos TPMS ainda não serem obrigatórios no Brasil.
Alguns especialistas brasileiros não recomendam sua utilização no país já que em muitas localidades a distância máxima de 80 km não permite se encontrar um posto de serviço adequado (que tenha um pneu substituto ou que possa reparar o pneu), o que é mais fácil nos EUA, Europa ou Japão, por exemplo. O CONTRAN tentou ampliar essa distância obrigando os veículos equipados com pneus run flat a virem equipados com um kit de selante para pneus e um dispositivo para insuflar o pneu em, no máximo, 10 minutos. Entretanto, o uso do selante não garante a integridade do pneu run flat que já pode ter rodado próximo de seu limite de uso quando da aplicação deste e já teria comprometido sua estrutura, o que poderia levar a uma falha por desagregação de seus componentes internos após rodar mais alguns quilômetros.
Além disso, argumentam que a eliminação do pneu estepe não resolve os casos em que o pneu run flat tenha sofrido um rasgo maior na banda de rodagem ou na lateral que comprometa sua estrutura, o que seria mais comum no Brasil dada a pior condição de grande parte de nossas ruas e estradas. Mesmo assim, na prática isso ainda é uma ocorrência menos frequente do que a perfuração por objetos pontiagudos como pregos e parafusos.
Entretanto, a decisão deve levar em conta a utilização do veículo pelo usuário. Se a rodagem for maior em centros urbanos, onde os postos de serviço mais bem equipados são mais facilmente encontrados, e as viagens forem em rodovias de grande movimento e de melhor qualidade de pavimento, sua utilização pode ser viável e vantajosa. Já se o uso em estradas de pior qualidade de pavimentação ou de terra e mais longe de centros urbanos for mais frequente, pode ser mais recomendável optar por pneus convencionais (se essa opção é possível) ou pelo menos equipar o veículo com um pneu estepe.
Nota:
* De acordo com uma pesquisa realizada há alguns anos pela Bridgestone no Brasil, em cada jogo de 4 pneus comprados para um automóvel de passeio ou caminhonete (ou que vieram montados de fábrica como equipamento original), pelo menos um deles terá pelo menos um furo durante sua vida útil, ou seja, 25% dos pneus rodando terão de receber um reparo para continuar a rodar.

* Nascido em 20/11/57 em São Paulo-SP, formou-se em engenharia mecânica na Poli/USP em 1981 e obteve mestrado na mesma área pelo Universidade de Minnesota, nos EUA, em 1985. Trabalhou inicialmente na área de tubulações industriais pela Promon Engenharia e depois como sócio fundador da Frontenge Engenharia, empresa de consultoria em projeto industrial. Em 1994 foi contratado pela Bridgestone do Brasil onde exerceu os cargos de engenheiro de campo depois gerente e gerente geral de engenharia de vendas até 2020 quando se aposentou e hoje atua como consultor. É autor de 2 livros, um deles sobre pneus. É casado e tem uma filha.
O Pneu de Automóvel: Um Guia Básico
– As opiniões contidas nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do 54PSI –