A verdade é: no Brasil, não existe mais pesquisa ou desenvolvimento no setor automotivo
Em 2016, escrevi um artigo no LinkedIn propondo um exercício premonitório e com um raio x da Engenharia de Desenvolvimento na área automotiva brasileira. Nele, além de tipificar o que é desenvolvimento e aplicação, concluiu-se que, desde o início da década passada, as montadoras aqui instaladas já deixavam claro um movimento de redução, até de interrupção, das atividades de pesquisa e desenvolvimento no país.
Infelizmente, chegamos a 2020 exatamente como previsto no texto: por diferentes motivos, as montadoras mantêm no Brasil apenas um pequeno grupo de engenheiros focados unicamente na aplicação.
Com times de Engenharia reduzidos e com recursos limitados (de tempo e de dinheiro), os campos de provas da Ford e General Motors ainda estarem em funcionamento não significa que são os últimos baluartes da Engenharia de Desenvolvimento ou foco de resistência do glorioso passado da indústria automotiva brasileira.
Ambos estão merecidamente na lista dos mais modernos campos de provas do mundo, mas são, hoje, motivos de preocupação para as filiais sulamericanas das gigantes americanas por estarem ociosos e sendo utilizados, como ambas montadoras deixam claro em seus sites e em vídeos institucionais, unicamente para realização de testes para garantia da qualidade dos veículos projetados e desenvolvidos em outras zonas, não no Brasil.
Testar as tecnologias desenvolvidas e em uso na Europa para utilizá-las em plataformas globais projetadas na China ou na Índia não é desenvolvimento, é aplicação. Para o país que pesquisa combustíveis alternativos desde os anos 1970 e desenvolveu o motor bicombustível, isso é muito pouco.
Exatamente como a conclusão do artigo, “o grande desafio que teremos para o futuro será o de recriar o cenário do Brasil no início do século… para então voltarmos a figurar como Centros Globais de Desenvolvimento e reestabelecer uma Engenharia de Desenvolvimento”.
Não encarar o cenário atual e nos enganar quanto o nosso papel no mapa automotivo global só fará com que este desafio se torne cada vez maior.
Entidades como SAE, AEA e ANFAVEA, com a ajuda de todos nós Engenheiros Automotivos, buscar meios de voltarmos à condição que ostentávamos no final do século XX para não vermos o nascimento da mobilidade do futuro sem que sejamos relevantes e protagonistas.
Carlos Barcha é especialista em pneus com 20 anos de experiência no setor automotivo, fundador e CEO da The Consulting Business Solutions e, também, Gerente Técnico da Michelin América do Sul. As opiniões e informações aqui expressas são pessoais e não refletem necessariamente o posicionamento destas empresas